terça-feira, 22 de outubro de 2013

Momento Preparo Jurídico no blog LPT - espelho de 2ª fase #05


Segue o espelho de 2ª fase #05, elaborado pela equipe do Preparo Jurídico - Curso para Concursos:


JUIZ HIGOR SANCHES - (Juiz no TRT da 23ª REGIÃO)

Inicialmente, cabe esclarecer que a exclusão de certos empregados do regime geral de jornada controlada, com fulcro no art. 62, inciso I, da CLT, decorre da presunção “juris tantum” de que os trabalhadores que exercem atividades externas não sofrem qualquer espécie de controle durante o decorrer da jornada de trabalho.

Cabe também ressaltar que a CLT foi introduzida em nosso ordenamento jurídico em 1943, sendo certo que houve o ancilosamente de suas normas ao decorrer das décadas, mesmo com as diversas tentativas de atualização do seu texto.

Nesse sentido, o art. 62, inciso I, da CLT, foi pensado em um tempo em que não havia formas de controle da jornada externa do obreiro, não existindo meios aptos a verificar em que lugar o trabalhador se encontrava, nem o quê o mesmo estava fazendo.

Essa realidade é impensável hodiernamente, uma vez que estamos em plena globalização, sendo característica do mundo atual a interligação da informação e a supressão do tempo ocioso.

Com efeito, o isolamento de antigamente deu lugar à integração da período atual, de maneira que não há mais lugar para institutos que tratam a jornada externa como uma jornada sem controle de horário, visto que a presunção deve ser invertida, ou seja, se o empregador não controla a jornada, nitidamente possuía meios para fazê-lo.

Nesse diapasão, o intuito da CLT não foi submeter o trabalhador externo a jornadas exaustivas, ferindo a dignidade do trabalhador e o submetendo à condições degradantes.

Dessa forma, o intuito da Lei nº 12.619 é moralizador, protegendo a saúde e segurança, não só do trabalhador, mas também de toda a sociedade, que vai se ver protegida de motoristas que, devido às jornadas exaustivas, necessitavam usar drogas e pareciam “sumbis” nas estradas, provocando acidentes e riscos constantes nas rodovias.

Antes da entrada em vigor da nova Lei, havia séria celeuma doutrinária acerca da possibilidade de controle da jornada do motorista, principalmente no que diz respeito ao rastreador, pois as empresas alegavam que tal instrumento servia apenas para a tutela patrimonial.

Entretanto, como pode o patrimônio ter mais importância que a saúde do trabalhador? Devemos lembrar que a Constituição prevê, em seu art. 1º, III, o princípio da dignidade da pessoal humana, que passa a ser o núcleo axiológico do sistema jurídico, irradiando seus efeitos por todo o ordenamento e influenciando a interpretação do direito, que agora passa pela lente dos princípios constitucionais, fenômeno chamado de filtragem constitucional.

Assim, não pode a carga ter mais valor que o ser humano, pois a Constituição tem o ser humano como centro e fim, Kant já falava “as coisas tem preço, o homem possui dignidade”.

Nesse sentido, acredito que, até mesmo antes da lei, se a empresa sabia que o labor por ela determinado não pode ser cumprido nos limites Constitucionais, fatalmente possuía consciência de que submetia o obreiro à condições degradantes.

E mais, ao adotar-se o entendimento de que o deferimento de horas extras ao empregado externo estaria subordinado à demonstração de que o trabalhador submete-se a efetivo controle de jornada, e não à compatibilidade das atividades desenvolvidas com o regime de duração do trabalho, ter-se-ia que a omissão do empregador em desempenhar seu encargo de vigiar o estrito cumprimento da jornada pactuada seria o bastante para induzir ao enquadramento do art. 62, I, da CLT, o que não é juridicamente razoável.

Sobre o tema, merece destaque o acórdão relatado pelo Min. João Oreste Dalazen, in verbis:

HORAS EXTRAS. MOTORISTA CARRETEIRO. CONTROLE DE JORNADA. ARTIGO 62, I, DA CLT. 1. A norma do artigo 62, inciso I, da CLT exclui o empregado do direito às horas extras quando incompatível o controle de horário, ou quando desenvolva atividade externa, por natureza insuscetível de propiciar aferição da efetiva jornada de labor. Preceito excepcional, há de ser interpretado restritivamente, em boa hermenêutica. (...) TST. – E-RR-423510/1998.0 – Ac. SDI1 – Rel.: Min. João Oreste Dalazen – DJ 4.4.2003, p. 593.


No mesmo sentido, cumpre transcrever o esclarecedor acórdão do Quarto Regional:

MOTORISTA. HORAS EXTRAS. ATIVIDADE EXTERNA COMPATÍVEL COM O CONTROLE DE JORNADA. A prestação de trabalho externo, por si só, não é suficiente para atrair a aplicação da exceção prevista no art. 62, I, da CLT, sendo necessário que o empregador comprove a real impossibilidade de controle da jornada de trabalho do empregado, o que não ocorria no caso. Recurso ordinário da reclamada não provido no aspecto, mantendo-se o deferimento de horas extras. Processo 0000756-78.2010.5.04.0662 (RO), Redator: WILSON CARVALHO DIAS, Participam: DENIS MARCELO DE LIMA MOLARINHO, ANA ROSA PEREIRA ZAGO SAGRILO, Data: 05/05/2011, Origem: 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo).


Esclareço que não é razoável presumir o desconhecimento da empresa sobre essa duração aproximada da viagem, principalmente quando o movimento por locais determinados constitui dado fulcral de suas operações. É certo que há alguém em algum lugar a esperar a carga e ela deve chegar dentro de certo prazo ou aquele alguém entrará em contato e fará a cobrança do resultado que é também objetivo da produção da empresa. Por isto, é natural que ela conheça as distâncias, estime uma velocidade média para o veículo dirigido pelo empregado e, assim, pela comparação entre as várias viagens realizadas, fixe quanto tempo ele levará para o cumprimento da tarefa. Hoje em dia, não se pode supor que um motorista saía para fazer suas entregas como se estivesse indo para o desconhecido e se perdesse em tempo e espaço. As conclusões sobre o tempo gasto por um veículo para percorrer um trajeto cuja extensão se conhece pertencem aos parâmetros da mecânica básica e isto não se altera porque há um motorista ou um trabalhador que está fora do estabelecimento da empresa. Ele, na verdade, carrega-o para uma rota cuja extensão é definida.

Quando se instruem processos em que estes temas são versados, a partir das perguntas feitas, a impressão que se tem é de que o empregado tem uma liberdade tão absoluta em relação a seu tempo externo que poderia se dar ao luxo de ir ao cinema no meio da tarde. Não é assim. Eles, hoje, prendem-se às empresas pelas teias da tecnologia e são controlados em relação a suas atividades de forma muito mais intensa do que outrora. Este espírito geral do big brother deixa uma margem muito reduzida para a efetiva aplicação do art. 62, I, da CLT.

Nesse sentido, a lei veio sanar quaisquer dúvidas ao determinar que é do empregador o dever de controlar a jornada dos motoristas, razão pela qual não há mais justificativa para se eximir de tal conduta.

Em relação ao art. 235-G, a proibição à remuneração por comissões visa a coibir o empregador de estimular a jornada exaustiva, pois com o pagamento desse tipo de remuneração, o empregado quanto mais trabalha mais ganha, fato que incentiva a extrapolação de jornadas e traz riscos à toda sociedade.

Assim, a remuneração do motorista não pode ser calculada por produção, em função da distância percorrida, tempo de duração da viagem, quantidade de produtos transportados, oferta de comissão ou outra vantagem que possa comprometer a segurança da rodovia e da coletividade.

Entretanto, o legislador permitiu a flexibilização através de normas coletivas, atendendo as especificidades caso, desde que não sejam prejudiciais à saúde e segurança do trabalhador.

Esse diploma legal veio amparar o anseio de toda a sociedade por melhores condições nas rodovias e, para os empregados, garantir a dignidade humana, razão pela qual deve ser visto como um avanço por todos.

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